quarta-feira, 2 de junho de 2010

IV - Alma.

Questionara-se repetidamente sobre isto: A problemática da existência se resume ao convívio? Ser humano é ser social, certo?

Por que ela isolava-se, então? Fechara os olhos para o mundo por tempo demais...E quando, finalmente, tornara a abri-los, o choque foi intenso demais.

Não que ela admitisse alguma fragilidade. Pelo contrário: por ter perdido tanto, sentia o estranho orgulho preenchido de mágoa dos sobreviventes.

Passara um longo tempo encarando as mãos que tanto atentaram contra ela, naquele dia. O dedo que antes exibia uma aliança, agora exibia dois aros dourados e uma cicatriz. Eram marcas pesadas para ela, precisava admitir de uma vez por todas.

Quando tivera a ilusão de que seguir em frente seria tão fácil? Em algum momento, todos retornam ao ponto de partida, afinal.

Estagnar por um dia, após ter aparentemente superado parecia absurdo e inadmissível. Espera-se que os mortos fiquem em paz, para sempre. Era incontestável, em seu íntimo, que o "deixar descansar em paz" fosse o mais correto.

Mas...céus, como era sofrido admitir que haveria uma eternidade de distância entre o corpo da perfumista e o corpo do escritor!

De toda forma, como recordar-se dele sem o pavor do rompimento e sem o caos das lembranças e dos sentimentos?

Ao menos, pensava, visitara o túmulo dele neste ano. Abandonara-se. Tentara chorar, mas as lágrimas desobedeciam-lhe e recusavam-se a descer. Talvez ela fosse uma fonte estéril e insensível; talvez as lágrimas simplesmente se esgotassem, algum dia.


Sofrera, como toda criatura sensível a um toque pode sofrer. Os toques que a atingiram, entretanto, a estilhaçaram.

Até que se reerguesse, passaria horas ao lado de um túmulo frio. Apoiaria-se no mesmo mármore frio para se levantar, e novamente, tentaria seguir.

Talvez não fosse uma vida de todo ruim, afinal. Sabia que sobrariam as saudades, que teria esses momentos cambaleantes no sepulcro. Contudo, estava armada, dessa vez
.

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